terça-feira, 4 de outubro de 2016

Proteina que continua fazendo glicose no fígado carbohydrate-responsive element-binding protein (CHREBP)

Rodrigo Polesso: Está começando. Está no ar o nosso puxão de orelha também. Vamos em frente para o segundo assunto, que é bastante interessante, principalmente você entende um pouco da questão de insulina, carboidratos, hormônios, fígado com gordura, triglicerídeos e etc. Vou começar com uma frase que o Dr. Souto que falou antes: o motivo principal da elevação da glicemia em pessoas que têm diabetes tipo 2, é a secreção de glicose pelo fígado, que não é inibida pela insulina. Vou ler uns parágrafos desse artigo, que foi publicado há 2 dias atrás, para introduzir o assunto: “De acordo com esse estudo, a causa da resistência à insulina pode ter pouco a ver com defeitos nos sinais da insulina e pode, na verdade, ser causada por um mecanismo separado desencadeado por excesso de açúcar no fígado que ativa um fator molecular conhecido como carbohydrate-responsive element-binding protein (CHREBP).” Essa proteína é encontrada em diversos órgãos metabólicos em ratos, humanos e outros mamíferos. No fígado, ela é ativada pela frutose que é ingerida. A frutose é uma forma de açúcar que naturalmente está presente nos legumes, frutas e açúcar de mesa. Ela também é adicionada em vários alimentos processados, como refrigerantes. O estudo descobriu que essa frutose inicia um processo que faz com que o fígado continue fabricando glicose e aumentando os níveis de glicose no sangue mesmo se a insulina está lá para tentar evitar esse processo. Esse mecanismo todo acontece por causa de um problema no fígado. É por isso que o pessoal que tem resistência à insulina fabrica muita glicose. Mas eles descobriram que não importa quanta insulina o pâncreas fabrique para tentar inibir essa fabricação de glicose, ele não consegue falar mais alto do que essa proteína nova que descobriram (CHREBP). No final das contas, isso vai aumentar os níveis de açúcar e também de insulina no sangue. Com o tempo, isso leva a um quadro de resistência à insulina. Essa proteína que foi descoberta é uma peça muito grande. O motivo principal da diabete tipo 2 é a secreção de glicose pelo fígado nessas pessoas, já que ela não é inibida pela fabricação de insulina, independentemente da quantidade de insulina que é fabricada. Dr. Souto, anteriormente você me passou vários passos, de como acontece esse processo. Acho que seria bem legal para o pessoal entender o processo.
Dr. Souto: A coisa é um pouco complicada, especialmente para quem não é da área médica. Vamos entender como é o normal; como o sistema funciona bem em quem não é doente. Se você está comendo uma fruta, por exemplo, a frutose (glicose) entra no organismo e o corpo a utiliza como fonte de energia. Essa glicose faz com que o pâncreas fabrique insulina. A insulina vai reduzir o valor da glicose no sangue e também bloqueia completamente a produção de glicose pelo fígado – o que é bom, já que se a pessoa comeu glicose, o fígado não precisa fabricar mais glicose ainda. Então, a mesma insulina que é produzida quando você come açúcar faz com que o fígado pare de fabricar açúcar. Por que que quando a pessoa está em jejum a glicose não cai perigosamente (hipoglicemia)? Porque quando a glicose baixa, isso desbloqueia a produção de glicose pelo fígado. Então, o fígado passa a produzir glicose no momento em que os níveis de insulina se reduzem – e isso é bom, porque daí a glicose se mantêm estável mesmo que a pessoa esteja comendo nada. O podcast número 11 fala sobre jejum intermitente. Se a pessoa ficar 24, 48 ou 72 sem comer, ela não ficará sem glicose para o cérebro porque o fígado fabrica glicose. Por que o fígado fabrica glicose? Porque a insulina está baixa, já que a pessoa não está comendo. Isso é o normal. No diabetes tipo 2, o fígado está resistente à insulina. Então, a glicose no sangue está alta e a insulina está alta também, já que está tentando fazer essa glicose baixar. Como a insulina está alta, o fígado não deveria fabricar glicose, já que a insulina está alta. Mas o fígado continua fabricando glicose no diabetes tipo 2. Então, a pessoa está com a insulina e com a glicose altas no sangue, e o fígado ao invés de parar de jogar mais glicose no sangue, ele continua jogando. O mecanismo através do qual isso ocorria era desconhecido. Havia uma suposição de que o fígado não respondia à insulina, como um problema do efeito da insulina no fígado. O que esses pesquisadores descobriram é que existe uma proteína (CHREBP) que faz com que o fígado comece a secretar glicose independentemente da insulina. Mas qual é a importância disso? Por que estamos falando desse assunto que parece ser tão técnico? É que essa proteína (carbohydrate-responsive element-binding protein) tem seu efeito desencadeado por carboidratos. Mas não é um carboidrato qualquer, é pela frutose. Então, a exposição crônica à quantidades grandes de frutose vai fazer com que esse proteína fique ativa e que o fígado pare de responder à insulina. Essa basicamente é a descoberta do link principal de ciência básica que explica porque o açúcar causa diabetes tipo 2. Eu aprendi na minha faculdade que o açúcar não causava diabetes, embora isso seja uma coisa absurdamente contra intuitiva. O Dr. Lustig, que tem o famoso vídeo “A Verdade Amarga do Açúcar”, já explicava em detalhes como o açúcar estava envolvido da gênese do diabetes. Mas ele não sabia – e ninguém sabia – o mecanismo molecular através do qual isso acontece. Mas ele já havia demonstrado, num estudo epidemiológico conduzido mais em mais de uma centena de países, que o açúcar tinha muito mais relação com o diabetes do que as calorias como um todo oriundas de outros alimentos. Ou seja, não eram calorias em geral, não eram carboidratos em geral, era especificamente o açúcar que estava envolvido com o risco de desenvolver diabetes. Agora nós sabemos porquê. Qual é a diferença entre um carboidrato de uma batata doce e um açúcar? A batata é amido, que é glicose. O açúcar é 50% frutose. A frutose que é responsável pela ativação dessa proteína que vai fazer com que o fígado comece a produzir açúcar independentemente do efeito da insulina. Aí alguém pode perguntar: “Então não posso comer nenhuma fruta?” Não é isso! São níveis suprafisiológicos de frutose. É a exposição crônica a níveis de frutose que jamais seriam atingidos comendo uma fruta de vez em quando. Ou seja, é a exposição ao açúcar, aos alimentos processados, a coisas como ketchup, sucos de fruta, suco de caixinha, refrigerantes. Essa proteína talvez não seja a única coisa. Esse é um estudo super recente, que tem que ser corroborado. Mas é muito interessante, já que é mais uma peça do quebra-cabeça que se encaixa, mostrando que o problema que o problema não é engordar, fazendo que a pessoa acumule gordura no fígado, fazendo com que o fígado fique com resistência à insulina e a pessoa fica diabética. Não! O que o estudo está mostrando é o seguinte: o açúcar que faz com que uma determinada proteína no fígado se desregule, tornando o fígado resistente à insulina, fazendo os níveis de glicose e insulina aumentarem, causando a resistência à insulina no resto do corpo e que leva ao acúmulo de gordura no fígado (que é uma consequência do processo e não causa). A gordura no fígado é um marcador, que indica que a pessoa está desenvolvendo resistência à insulina no fígado. Mas a causa é o açúcar. É o excesso de frutose. É o excesso de carboidrato especificamente de açúcar e carboidrato processado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário