Nutrição é pessoal. Comidas idênticas produzem respostas "saudáveis" e "não-saudáveis" em indivíduos diferentes.
Artigo traduzido por Antônio Júnior e Hilton Sousa. O original está aqui.
Na edição de hoje da Revista Cell,
dois grupos liderados por Eran Elinav e Eran Segal apresentaram um
trabalho impressionante surpreendente, fornecendo novos insights sobre a
natureza pessoal da nutrição. As equipes de pesquisas israelenses
demonstraram que existe um elevado grau de variabilidade nas respostas
de diferentes indivíduos a refeições idênticas, e através da aplicação
elegante de aprendizado de máquina, forneceram idéias sobre os diversos
fatores subjacentes a essa variabilidade
Respostas glicêmicas de pacientes diferentes à ingestão de cookies e de bananas
Como fatores genéticos sabidamente modulam as respostas inatas de indivíduos a doenças, medicações e metabólitos no sangue, pode não ser surpresa que indivíduos não respondem a alimentos idênticos da mesma maneira.
Seguindo-se a uma refeição, os níveis de glicose aumentam de acordo com o tipo do alimento ingerido. Atualmente, carboidratos dietéticos ou índices glicêmicos são usados para estimar a resposta glicêmica pós-prandial (PPGR). Esses fatores assumem que os PPGRs dependem somente das propriedades intrínsecas do alimento ingerido, e essa premissa é a base das recomendações dietéticas universais.
Enquanto foi proposto que diferenças individuais no PPGR podem ser influenciadas por fatores diversos como genética, estilo de vida e sensibilidade à insulina, bem como aos níveis de atividade exócrina do pâncreas e dos transportadores de glicose, a influência da microbiota intestinal sobre o PPGR é relativamente mal-compreendida.
Para entender melhor essas relações, os times de Elinav e Segal buscaram quantificar PPGRs individuais de uma amostra populacional, caracterizar a variabilidade dentro desta e então identificar fatores associados à variabilidade. Apesar de isso poder ser feito com um conjunto pequeno, de cerca de 1 dúzia, ou talvez algumas dúzias, não foi a abordagem tomada pelo time.
Observações de 800 participantes
Elinav e Segal reportaram em suas observações de uma coorte de 800
indivíduos saudáeis e pré-diabéticos, uma amostra populacional
representativa da maior população ocidental não-diabética.
Cada membro da população amostral foi conectada a um monitor contínuo de glicemia que avaliou seus níveis de glicose intersticiais a cada 5 minutos por 1 semana (usando sensores subcutâneos). Eles coletaram mais de 2000 medidas por particiante, totalizando mais de 1.6 milhões de medidas para a população inteira.
Para compreender melhor a relação entre a glicemia medida e as fisiologias e estilos de vida únicos dos participantes do estudo, os times coletaram um conjunto extremamente diverso de informação de cada pessoa. Os participantes mantiveram diários de atividade física, ingestão de alimentos e sono, usando um aplicativo no smartphone. Essa informação foi então complementada com perfis extensos que os pesquisadores coletaram de cada sujeito, incluindo frequência alimentar, estilo de vida, histórico médico, medidas antropométricas (peso, altura, diâmetro do quadril, etc), exames completos de sangue e amostras de fezes para avaliação da microbiota.
Quando os pesquisadores analisaram os resultados coletados, suas descobertas divergiram surpreendentemente do esperado. Como esperado, os pesquisadores foram capazes de validar associações conhecidas de PPGRs com fatores de risco como BMI, hemoglobina glicada, glicemia em jejum e idade. Os cientistas fizeram algumas observações importantes, notando que estas não estavam limitadas aos valors extremos: associações entre esses fatores conhecidos de risco ocorreram em todo o espectro fenotípici, indicando que diferenças incrementais na resposta glicêmica podem ser clinicamente relevantes para alguns fatores de risco.
Cada membro da população amostral foi conectada a um monitor contínuo de glicemia que avaliou seus níveis de glicose intersticiais a cada 5 minutos por 1 semana (usando sensores subcutâneos). Eles coletaram mais de 2000 medidas por particiante, totalizando mais de 1.6 milhões de medidas para a população inteira.
Para compreender melhor a relação entre a glicemia medida e as fisiologias e estilos de vida únicos dos participantes do estudo, os times coletaram um conjunto extremamente diverso de informação de cada pessoa. Os participantes mantiveram diários de atividade física, ingestão de alimentos e sono, usando um aplicativo no smartphone. Essa informação foi então complementada com perfis extensos que os pesquisadores coletaram de cada sujeito, incluindo frequência alimentar, estilo de vida, histórico médico, medidas antropométricas (peso, altura, diâmetro do quadril, etc), exames completos de sangue e amostras de fezes para avaliação da microbiota.
Quando os pesquisadores analisaram os resultados coletados, suas descobertas divergiram surpreendentemente do esperado. Como esperado, os pesquisadores foram capazes de validar associações conhecidas de PPGRs com fatores de risco como BMI, hemoglobina glicada, glicemia em jejum e idade. Os cientistas fizeram algumas observações importantes, notando que estas não estavam limitadas aos valors extremos: associações entre esses fatores conhecidos de risco ocorreram em todo o espectro fenotípici, indicando que diferenças incrementais na resposta glicêmica podem ser clinicamente relevantes para alguns fatores de risco.
Nutrição é pessoal. Existe um alto grau de variabilidade nas respostas de diferentes pessoas a um mesmo alimento
As observações coletadas revelaram que ambas as resposta individuais a
um mesmo alimento eram reprodutíveis, e que existe um alto nível de
variabilidade na resposta de indivíduos diferentes aos mesmos alimentos.
Os pesquisadores descobriram que a comida associada com a resposta mais
elevada de glicemia variava enormemente entre indivíduos. Comidas que
induzem uma resposta "saudável" em um indivíduo poderiam induzir uma
resposta "não-saudável" em outro. Em um exemplo particularmente
convincente, os pesquisadores mostraram que dois participantes tinham
respostas opostas a cookies e bananas.
O participante A manteve uma glicemia estável após comer um cookie, mas
respondeu com níveis elevados de glicose após comer uma banana. Da mesma
maneira, o participante B teve um aumento na glicemia após comer um
cookie, mas não após consumir uma banana.
Em outro exemplo marcante, um dos participantes, uma mulher de meia
idade que era obesa e pré-diabética aprendeu que seus hábitos
"saudáveis" podem na prática terem sido ruins para ela. Os pesquisadores
descobriram que em seu caso, comer tomates resultava em um pico
"insalubre" de glicemia, enquanto ela comeu esse alimento frequentemente
ao longo do período de monitoramento de 1 semana. Esse hábito
"saudável" estava minando a sua saúde.
Dentro do seu conjunto de dados, os times de pesquisa de Elimav e Segal
encontraram múltiplas associações significativas entre as PPGRs dos
participantes logo após refeições padronizadas, e ambos tiveram seus
dados – clínicos e da microbiota – correlacioandos com IMC, HbA1c,
pressão e atividade da ALT (alanina aminotransferase). Com os dados da
microbiota, os pesquisadores notaram que uma preponderância de
Probacteria e Enterobacteriacea esteve positivamente associada com
PPGRs.
Esse gráfico mostra as entradas usadas para desenvolver um algoritmo preditor para nutrição personalizada
Identificando perfis pessoais de resposta nutricional usando um algoritmo de aprendizado de máquina
Usando seu conjunto de dados acumulados, os pesquisadores então deram um
passo além, aplicando um algoritmo de aprendizado de máquina a sua
coorte de 800 participantes e desenvolvendo um algoritmo capaz de
predizer PPGRs. Esse algoritmo intricado incorpora 137 características
representando o conteúdo da refeição, atividade diária, parâmetros
sanguíneos, características derivadas do MCG, questionários e
particularidades do microbioma. O modelo prediz os PPGR medidos com uma
correlação significativamente alta (R=0.68) do que simplesmente confiar
na contagem de carboidratos (R=0.38) ou no aporte calórico da refeição
(R=0.33).
Validação do algoritmo usando uma coorte independentemente recrutada
Indo ainda mais longe, o time de pesquisadores recrutou então um coorte
separado de 100 participantes e validou a capacidade preditiva do seu
algoritmo. Finalmente, revelando a verdadeira utilidade da sua
abordagem, um grupo final de participantes foi recrutado para um estudo
intevencional. Esse estudo usou um conjunto de 26 participantes,
distribuídos em dois grupos experimentais: um que iria aplicar as
predições desenvolvidas por um expert em nutrição e um pesquisador
trabalhando em juntos usando monitoramento contínuo da glicemia, e um
que iria usar o algoritmo que o time desenvolveu. Cada participante foi
então associado, de maneira duplo-cega e aleatória, a 1 semana na dieta
boa, e a 1 semana na dieta ruim.
Aplicação do algoritmo a um estudo intervencional
Os resultados do estudo intervencional revelaram que as dietas
desenvolvidas tanto pelos experts em nutrição/time de pesquisa e pelo
algoritmo resultaram em menor variabilidade da glicemia na dieta boa, e
os resultados indicaram que os dois métodos tiveram eficácia similar.
Impressionante, as amostras diárias da microbiota desses participantes
revelaram que mesmo intervenções dietéticas de curto prazo induziram
mudanças na microbiota. A "boa" dieta foi consistente com um aumento das
bactérias benéficas, com um decréscimo recíproco seguindo-se à dieta
"ruim".
O resumo do estudo pode ser lido aqui.
O resumo do estudo pode ser lido aqui.
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