terça-feira, 12 de abril de 2016

DEFICIÊNCIA DE B12: UMA EPIDEMIA SILENCIOSA COM CONSEQUÊNCIAS SÉRIAS

DEFICIÊNCIA DE B12: UMA EPIDEMIA SILENCIOSA COM CONSEQUÊNCIAS SÉRIAS

Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.

por Chris Kresser

O quê todas essas doenças têm em comum ? 

  • Alzheimer, demência, declínio cognitivo e perda de memória (referimo-nos a elas coletivamente como "envelhecimento")
  • Esclerose múltipla e outros distúrbios neurológicos
  • Transtornos mentais (depressão, ansiedade, transtorno bipolar, psicose)
  • Doença cardiovascular
  • Transtornos de aprendizagem ou desenvolvimento em crianças
  • Distúrbios do espectro autista
  • Doenças e desregulações autoimunes 
  • Câncer
  • Infertilidade masculina e feminina

Resposta: elas podem simular os sinais e sintomas de deficiência de vitamina B12.

Deficiência de B12: uma epidemia invisível


Deficiência de B12 não é uma doença bizarra e misteriosa. Ela está descrita em praticamente todo livro de medicina e suas causas e efeitos estão bem estabelecidas na literatura científica.

Entretanto, deficiência de B12 é muito mais comum do que a maioria dos profissionais de saúde e o público em geral perceem. Dados do Estudo Derivado de Framingham pela Universidade Tufts sugerem que 40% das pessoas entre 26 e 83 anos têm os níveis de B12 sérico abaixo no normal – uma faixa na qual muitos apresentam sintomas neurológicos. 9% tinham deficiência gritante e 16% exibiram "quase deficiência". O mais surpreendente para os pesquisadores foi o fato de que níveis baixos de B12 foram tão comuns em jovens quanto em idosos.

Dito isso, estimou-se que a deficiência de B12 afete cerca de 40% das pessoas acima de 60 anos de idade. É perfeitamente possível que ao menos alguns dos sintomas que atribuímos ao envelhecimento "normal" – tais como perda de memória, declínio cognitivo, mobilidade reduzida, etc – sejam ao menos em parte causados pela deficiência de B12.

Por que a deficiência de B12 é tão sub-diagnosticada ?


A deficiência de B12 frequentemente é despercebida por duas razões. Primeiro, não é uma vitamina rotineiramente testada pela maioria dos médicos. Segundo, o limite inferior da referência laboratorial é baixo demais. É por isso que a maioria dos estudos subsestima os verdadeiros níveis de deficiência. Muitas pessoas deficientes em B12 em exames apresentam os chamados níveis "normais" de B12.

E ainda assim está estabelecido na literatura que as pessoas com níveis de B12 entre 200 e 350pg/mL – considerados "normais" nos EUA – têm sintomas claros de deficiência de B12. Especialistas no diagnóstico e tratamento da deficiência de B12 como Sally Pacholok e Jeffery Stewart, sugerem tratar todos os pacientes que são sintomáticos e têm níveis de B12 inferiores a 450pg/mL. Eles também recomendam tratar os pacientes que têm níveis normais de B12 mas ácido metilmalônico (AMM), homocisteína e/ou holotranscobalamina (outros marcadores de deficiência de B12) elevados na urina.

No Japão e Europa o limite inferior para B12 está entre 500 e 550pg/mL – o nível associado com manifestações psicológicas e comportamentais tais como declínio cognitivo, demência e perda de memória. Alguns especialistas já especularam que a aceitação de níveis mais altos como normais no Japão e o desejo de tratar níveis considerados "normais" nos EUA explicam as baixas taxas de Alzheimer e demência naquele país.

O que é vitamina B12 e por que você precisa dela ?


Vitamina B12 funciona junto com o folato na síntese do DNA e das células vermelhas do sangue. Também está envolvida na produção da bainha de mielina ao redor dos nervos, e na condução dos impulsos nervosos. Você pode pensar no cérebro e no sistema nervoso como um grande emaranhado de fios. A mielina é o isolamento que protege esses fios e os ajuda a conduzir as mensagens.

Deficiência severa de B12 em condições como anemia perniciosa (uma condição autoimune na qual o corpo destroi o fator instrínseco, uma proteína necessária para a absorção de B12) costumava ser fatal até que os cientistas perceberam que a morte poderia ser evitada ao alimentar os pacientes com fígado cru (que contém altas quantidades de B12). Mas anemia é o estágio final da deficiência de B12. Muito antes dela estabelecer-se, a deficiência de B12 causa diversos outros problemas incluindo fadiga, letargia, fraqueza, perda de memória e problemas neurológicos e psiquiátricos.

A deficiência de B12 ocorre em quatro estágios, começando com o declínio de níveis sanguíneos da vitamina (estágio I), progredindo para baixa concentração celular da vitamina (estágio II), níveis aumentados de homocisteína e redução da taxa de síntese de DNA (estágio III) e finalmente anemia macrocítica (estágio IV).

Por que a deficiência de B12 é tão comum ?


A absorção de B12 é complexa e envolve diversos passos – cada um dos quais pode dar errado. Causas da má-absorção de B12 incluem:

  • Disbiose intestinal
  • Intestino permeável e/ou inflamação
  • Gastrite atrófica ou hipocloridria (pouco ácido estomacal)
  • Anemia perniciosa (condição autoimune)
  • Medicamentos (especialmente inibidores da bomba de prótons (PPIs) e outros supressores de acidez)
  • Álcool
  • Exposição ao óxido nitroso (durante cirurgia e uso recreacional)

Isso explica o motivo da deficiência de B12 poder ocorrer mesmo em pessoas que comem alimentos de origem animal que contêm grandes quantidades de B12. Na prática, muitos dos meus pacientes deficientes em B12 seguem uma dieta paleo na qual comem carne 2-3 vezes ao dia.

Em geral, os seguintes grupos estão em maior risco de deficiência de B12:

  • Vegetarianos e veganos
  • Pessoas com 60 anos ou mais
  • Pessoas que regularmente usam PPIs e antiácidos
  • Pessoas que fazem uso de drogas antidiabéticas como metformina
  • Pessoas com doença de Crohn, colite ulcerativa, celíacos ou SII
  • Mulheres com histórico de infertilidade ou aborto

Nota para vegetarianos e veganos: B12 é encontrada APENAS em produtos de origem animal

B12 é a única vitamina que contém o elemento cobalto – que é o motivo do seu nome ser "cobalamina". A cobalamina é produzida no intestino de animais. É a única vitamina que não conseguimos obter de plantas ou da luz do sol. Plantas não precisam de B12, então elas não a armazenam.

Um mito comum entre vegetarianos e veganos é que é possível obter B12 de fontes vegetais como algas marinhas, soja fermentada, spirulina e levedura de cerveja. Mas alimentos animais que supostamente contêm B12 na verdade contêm análogos da B12 chamadas cobamidas – que bloqueiam a absorção e aumentam a necessidade pela B12 real.

Isso explica o motivo de estudos consistentemente demonstrarem que até 50% dos vegetarianos de longo prazo e 80% dos veganos serem deficientes em B12.

Os efeitos da deficiência de B12 em crianças são especialmente alarmantes. Estudos já mostraram que crianças criadas em uma dieta vegana até os 6 anos ainda são deficientes em B12 mesmo anos após começarem a comer ao menos um pouco de produtos animais. Em um estudo os pesquisadores descobriram:

 ... uma associação significativa entre o estado da cobalamina [B12] e a performance em testes medindo inteligência fluida, habilidade espacial e memória de curto prazo, com crianças ex-veganas tendo resultados piores que as onívoras em cada caso.

O déficit na inteligência fluida é particularmente perturbador, disseram os pesquisadores, porque:

 ... ele envolve raciocínio, a capacidade de resolver problemas complexos, a capacidade de pensamento abstrato e a habilidade de aprender. Qualquer deficiência nessa área pode ter consequências que vão longe para o funcionamento do indivíduo.

Eu reconheço que há muitas razões pelas quais as pessoas escolhem comer da maneira que comem, e respeito o direito delas de fazer as próprias escolhas. Também sei que, como qualquer pai, vegetarianos e veganos querem o melhor para seus filhos. Esse é o motivo pelo qual é absolutamente crucial para aqueles que se abstêm de produtos animais compreendam que não há fontes vegetais de B12 e que todos os veganos e a maioria dos vegetarianos deveriam suplementar com B12. Isso é especialmente importante para crianças vegetarianas ou veganas ou mulheres grávidas, cuja necessidade de B12 é ainda maior.

Tratamento da deficiência de B12


Uma das maiores tragédias da epidemia de deficiência de B12 é que o diagnóstico e tratamento são relativamente fáceis e baratos – especialmente quando comparado ao tratamento das doenças que a deficiência pode causar. Um teste de B12 pode ser feito em qualquer laboratório, e deve estar coberto pelo plano de saúde. 

Como sempre, tratamento adequado depende da causa subjacente do problema. Pessoas com anemia perniciosa ou distúrbios intestinais inflamatórios como doença de Crohn têm probabilidade maior de absorção prejudicada pela vida inteira, e vão provavelmente precisar de injeções de b12 indefinidamente. Isso também pode ser verdade para aqueles com deficiência séria de B12 que causa sintomas neurológicos.

Alguns estudos recentes sugeriram que a administração de altas doses via oral ou nasal pode ser tão eficiente quanto injeções, para aqueles com problemas de má-absorção de B12. Entretanto, a maioria dos especialistas em B12 ainda recomenda injeções para as pessoas com anemia perniciosa e deficiência avançada de B12 envolvendo sintomas neurológicos.

Cianocobalamina é a forma mais frequentemente usada de suplementação de B12 nos EUA. Mas evidências recentes sugerem que a hidroxicobalamina (frequentemente usada na Europa) é superior à cianocobalamina, e que a metilcobalamina pode ser superior a ambas – especialmente para doença neurológica.

Estudos japoneses indicam que a metilcobalamina é ainda mais eficiente no tratamento de sequelas neurológicas da deficiência de B12, e que pode ser ainda melhor absorvida porque ultrapassa diversos problemas potenciais no ciclo de absorção de B12. Além disso tudo, a metilcobalamina provê o corpo com grupos metila que têm função em vários processos biológicos importantes para a saúde geral.

Se você é suspeito de ter deficiência de B12, o primeiro passo é fazer o testes. Você precisa de uma base de comparação precisa com a qual trabalhar. Se você é deficiente em B12, o passo seguinte é identificar o mecanismo que causa a deficiência. Isso é algo com o qual você provavelmente vai precisar da ajuda de um médico. Uma vez que o mecanismo seja identificado, a forma apropriada (injeção, oral, sublingual ou nasal) de suplementação, a dose e a duração do tratamento podem ser selecionadas.

Então, da próxima vez que você ou algum conhecido estiver tendo um "momento de idoso", lembre-se: pode não ser "apenas a idade". Pode ser deficiência de B12.

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