O (ridículo) ranking das dietas segundo a U.S. News & World Report
Você já assistiu o filme Feitiço do Tempo (Groundhog Day), com Bill Murray? A Wikipedia relembra a trama: A história se passa na cidade de Punxsutawney, na Pensilvânia, em que Murray personifica um presunçoso e arrogante meteorologista da tevê que é escalado para a cobertura do tradicional Dia da Marmota (2 de fevereiro); ele, contudo, fica preso numa armadilha temporal que o faz reviver o mesmo dia vezes sem fim; embora no começo ele aproveite a repetição para agir de forma irresponsável, acaba ficando cansado em ter de sucessivamente acordar ao som de I Got You Babe de Sonny & Cher; no processo repetitivo termina por aproveitar a oportunidade para se melhorar como pessoa, e finalmente conquistar a personagem vivida por Andie MacDowell.[4]
Todos os anos, em janeiro, a revista U.S. News & World Report publica um ranking das dietas. É o "dia da marmota" da nutrição. Não importa se estamos em 2014 ou 2018 - é SEMPRE a mesma coisa! Aliás, já escrevi em 2014 a mesma coisa.
Basicamente, a revista pede que um "painel de experts" faça um ranking das dietas. O critério? O quão próximo das diretrizes vigentes uma dieta é. O resultado? As dietas oriundas das diretrizes são classificadas como as melhores. Low carb, cetogênica, páleo, disputam sempre o último lugar (afinal, são diferentes das diretrizes vigentes). Ninguém leva em conta ensaios clínicos randomizados ou metanálises - pra quê?
Seria como se eu resolvesse pedir à torcida organizada de um time de futebol para fazer um ranking dos times brasileiros. Já saberíamos, por definição, quem estaria no topo.
Este ano, porém, o jornal Los Angeles Times publicou um editorial de nada menos do que Gary Taubes e Nina Teicholz sobre o assunto.
Com tradução de Liss Bischoff, do site http://www.resistencia-insulina.com.br/, segue o texto.
O U.S. News está errado a respeito do que constitui a melhor dieta
Você que está de dieta, cuidado: o U.S. News & World Report, na sua famosa manchete de janeiro, “melhores dietas”, apontou a DASH e a Mediterrânea como as melhores dietas para a saúde, embora essas dietas representem o fracassado status quo nutricional dos últimos 50 anos.
A DASH está listada em primeiro lugar no ranking da U.S. News, mas estudos de revisão descobriramque ela foi testada em apenas cerca de 2.000 indivíduos (principalmente hipertensos de meia idade), em estudos durando não mais do que seis meses. Seus efeitos dificilmente podem ser generalizados para todos os americanos.
Nesses estudos limitados, a dieta, que promove frutas, vegetais e laticínios de baixo teor de gordura, reduziu alguns fatores de risco cardiovascular, tais como a pressão sanguínea. Mas, em geral, piorou outros, tais como o colesterol HDL (colesterol “bom”) e triglicerídeos. E, na primeira e única vez em que foi testada contra uma versão de si mesma com maior teor de gordura, a versão de maior teor gordura teve melhores resultados.
DASH – o acrônimo significa Dietary Approaches to Stop Hypertension (abordagens dietéticas para parar a hipertensão) – tem sido promovida pelo governo norte americano há mais de 20 anos, mas a evidência ainda está muito distante de demonstrar um impacto significativo em relação às principais doenças nutricionais dos nossos tempos, especialmente obesidade e diabetes. Essas desordens gêmeas constituem uma epidemia de saúde pública global de proporções críticas, um “desastre em câmera lenta”, nas palavras do diretor geral da Organização Mundial da Saúde. O ranking “melhores” do U.S. News teoricamente seria uma tentativa de combater essas doenças, mas acaba enaltecendo uma dieta com praticamente nenhuma capacidade demonstrada de tratar ou preveni-las.
A dieta Mediterrânea, listada como segunda melhor para a saúde geral pelo U.S. News, se sai um pouco melhor com relação às evidências. Muito popular desde a sua introdução formal em 1993 pela escola de saúde pública de Harvard, e selecionada pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos em 2015 como uma das suas três “dietas padrão” recomendadas, a dieta foi estudada principalmente em um ensaio de 2013, com cerca de 7.500 indivíduos na Espanha. Depois de cinco anos, aqueles na dieta reduziram seu risco de eventos cardiovasculares em insignificantes 2%, em termos absolutos. Além disso, a dieta não teve impacto na mortalidade geral ou peso perda. E o ensaio em si tinha falhas; não tinha um grupo controle comparativo adequado.
Está claro que o U.S. News – que empregou um painel de especialista para avaliar 40 dietas em vários critérios – meramente recapitulou a recomendação dietética questionável que passou por uma sucessão de nomes desde a década de 1970 – “low fat” (baixo teor de gordura), “DASH”, “USDA-style”, “baseado em plantas”. O conjunto básico de recomendações tem permanecido o mesmo, enfatizando alimentos de origem vegetal (grãos, cereais, frutas e vegetais) em detrimento de produtos de origem animal (ovos, laticínios integrais, carnes) e óleos vegetais em detrimento de gorduras animais naturais tais como a manteiga.
De acordo com dados do governo, os americanos têm seguido amplamente estas recomendações pelos últimos 50 anos, aumentando notavelmente o seu consumo de grãos, legumes e frutas, e consumindo menos leite integral, queijo, manteiga, carne e ovos. O resultado? Durante esse tempo, as taxas de obesidade e Diabetes Tipo 2 dispararam. Alguma coisa está terrivelmente errada.
Por que 25 médicos e nutricionistas do painel do U.S. News teriam escolhido uma filosofia dietética que tem – pelo menos até agora – falhado conosco? Eles podem estar entrincheirados em suas opiniões, apoiados pelas indústrias que se beneficiam com essas dietas, motivados por agendas não relacionadas à nutrição, tais como ativismo dos direitos dos animais, ou eles podem simplesmente ter sucumbido à fácil conveniência do pensamento coletivo.
O prejuízo para aqueles que pretendem comer de forma saudável é profundo. Por exemplo, dietas baixas em carboidrato e mais altas em gordura – chamadas variadamente de “Atkins”, “paleo”, “cetogênica” ou “South Beach”, e baseadas na simples ideia de que os carboidratos são particularmente engordantes – foram todas negligenciadas no ranking do U.S. News. Na verdade, a dieta cetogênica, que restringe acentuadamente carboidratos em favor de gordura, apareceu em último lugar.
Isso é muito ruim: resultados preliminares de um ensaio clínico randomizado recente indicaram que sintomas de diabetes tipo 2 podem ser revertidos em apenas 10 semanas nesse tipo de dieta.Indivíduos que sofriam de diabetes eram ensinados sobre carboidratos e acompanhados durante o período do estudo. Eles efetivamente curaram a si mesmos de sua doença, algo que a medicina convencional nem mesmo acredita ser possível.
Estes são resultados preliminares, mas muitos outros estudos sobre dietas low carb apresentam resultados positivos que são igualmente encorajadores para pessoas com doenças relacionadas à nutrição. Dietas low carb têm sido testadas em pelo menos 78 ensaios clínico randomizados em cerca de 7.000 pessoas, incluindo uma ampla variedade de populações doentes e saudáveis, principalmente nos Estados Unidos. Trinta e dois desses estudos duraram pelo menos seis meses, e seis ensaios tiveram duração de dois anos, tempo suficiente para demonstrar que não há qualquer efeito colateral negativo. Em praticamente todos os casos, as dietas de menor carboidrato e maior teor de gordura tiveram resultados iguais ou melhores do que as dietas concorrentes. As evidências cumulativas mostram que as dietas low carb são seguras e eficazes para combater obesidade, são altamentepromissoras para o tratamento de Diabetes Tipo 2 e melhoram mais os fatores de risco cardiovascular.
No meio de uma crise mundial de obesidade e diabetes, nós não precisamos de mais contribuições de especialistas que não prestam atenção na ciência mais recente ou que não conseguem se libertar de 50 anos de pensamento convencional sobre o que é comer saudável. Promover a mesma recomendação dietética de novo e de novo, enquanto se espera resultados diferentes é realmente um tipo de insanidade, e pior, não está fazendo nada para combater o aumento de doenças e das taxas de mortalidade. Consumidores necessitam informações sólidas sobre como comer para uma boa saúde. A publicação “melhores dietas” do U.S. News não chega nem perto disso.
Gary Taubes é co-fundador da Nutrition Science Initiative e a autor de “The Case Against Sugar”. Nina Teicholz é a fundador da Nutrition Coalition, uma jornalista investigativa e autora do best-seller “The Big Fat Surprise”.
Todos os anos, em janeiro, a revista U.S. News & World Report publica um ranking das dietas. É o "dia da marmota" da nutrição. Não importa se estamos em 2014 ou 2018 - é SEMPRE a mesma coisa! Aliás, já escrevi em 2014 a mesma coisa.
Basicamente, a revista pede que um "painel de experts" faça um ranking das dietas. O critério? O quão próximo das diretrizes vigentes uma dieta é. O resultado? As dietas oriundas das diretrizes são classificadas como as melhores. Low carb, cetogênica, páleo, disputam sempre o último lugar (afinal, são diferentes das diretrizes vigentes). Ninguém leva em conta ensaios clínicos randomizados ou metanálises - pra quê?
Seria como se eu resolvesse pedir à torcida organizada de um time de futebol para fazer um ranking dos times brasileiros. Já saberíamos, por definição, quem estaria no topo.
Este ano, porém, o jornal Los Angeles Times publicou um editorial de nada menos do que Gary Taubes e Nina Teicholz sobre o assunto.
Com tradução de Liss Bischoff, do site http://www.resistencia-insulina.com.br/, segue o texto.
U.S. News is wrong about what constitutes the best diet
by Gary Taubes and Nina Teicholz
O U.S. News está errado a respeito do que constitui a melhor dieta
Você que está de dieta, cuidado: o U.S. News & World Report, na sua famosa manchete de janeiro, “melhores dietas”, apontou a DASH e a Mediterrânea como as melhores dietas para a saúde, embora essas dietas representem o fracassado status quo nutricional dos últimos 50 anos.
A DASH está listada em primeiro lugar no ranking da U.S. News, mas estudos de revisão descobriramque ela foi testada em apenas cerca de 2.000 indivíduos (principalmente hipertensos de meia idade), em estudos durando não mais do que seis meses. Seus efeitos dificilmente podem ser generalizados para todos os americanos.
Nesses estudos limitados, a dieta, que promove frutas, vegetais e laticínios de baixo teor de gordura, reduziu alguns fatores de risco cardiovascular, tais como a pressão sanguínea. Mas, em geral, piorou outros, tais como o colesterol HDL (colesterol “bom”) e triglicerídeos. E, na primeira e única vez em que foi testada contra uma versão de si mesma com maior teor de gordura, a versão de maior teor gordura teve melhores resultados.
DASH – o acrônimo significa Dietary Approaches to Stop Hypertension (abordagens dietéticas para parar a hipertensão) – tem sido promovida pelo governo norte americano há mais de 20 anos, mas a evidência ainda está muito distante de demonstrar um impacto significativo em relação às principais doenças nutricionais dos nossos tempos, especialmente obesidade e diabetes. Essas desordens gêmeas constituem uma epidemia de saúde pública global de proporções críticas, um “desastre em câmera lenta”, nas palavras do diretor geral da Organização Mundial da Saúde. O ranking “melhores” do U.S. News teoricamente seria uma tentativa de combater essas doenças, mas acaba enaltecendo uma dieta com praticamente nenhuma capacidade demonstrada de tratar ou preveni-las.
A dieta Mediterrânea, listada como segunda melhor para a saúde geral pelo U.S. News, se sai um pouco melhor com relação às evidências. Muito popular desde a sua introdução formal em 1993 pela escola de saúde pública de Harvard, e selecionada pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos em 2015 como uma das suas três “dietas padrão” recomendadas, a dieta foi estudada principalmente em um ensaio de 2013, com cerca de 7.500 indivíduos na Espanha. Depois de cinco anos, aqueles na dieta reduziram seu risco de eventos cardiovasculares em insignificantes 2%, em termos absolutos. Além disso, a dieta não teve impacto na mortalidade geral ou peso perda. E o ensaio em si tinha falhas; não tinha um grupo controle comparativo adequado.
Está claro que o U.S. News – que empregou um painel de especialista para avaliar 40 dietas em vários critérios – meramente recapitulou a recomendação dietética questionável que passou por uma sucessão de nomes desde a década de 1970 – “low fat” (baixo teor de gordura), “DASH”, “USDA-style”, “baseado em plantas”. O conjunto básico de recomendações tem permanecido o mesmo, enfatizando alimentos de origem vegetal (grãos, cereais, frutas e vegetais) em detrimento de produtos de origem animal (ovos, laticínios integrais, carnes) e óleos vegetais em detrimento de gorduras animais naturais tais como a manteiga.
De acordo com dados do governo, os americanos têm seguido amplamente estas recomendações pelos últimos 50 anos, aumentando notavelmente o seu consumo de grãos, legumes e frutas, e consumindo menos leite integral, queijo, manteiga, carne e ovos. O resultado? Durante esse tempo, as taxas de obesidade e Diabetes Tipo 2 dispararam. Alguma coisa está terrivelmente errada.
Por que 25 médicos e nutricionistas do painel do U.S. News teriam escolhido uma filosofia dietética que tem – pelo menos até agora – falhado conosco? Eles podem estar entrincheirados em suas opiniões, apoiados pelas indústrias que se beneficiam com essas dietas, motivados por agendas não relacionadas à nutrição, tais como ativismo dos direitos dos animais, ou eles podem simplesmente ter sucumbido à fácil conveniência do pensamento coletivo.
O prejuízo para aqueles que pretendem comer de forma saudável é profundo. Por exemplo, dietas baixas em carboidrato e mais altas em gordura – chamadas variadamente de “Atkins”, “paleo”, “cetogênica” ou “South Beach”, e baseadas na simples ideia de que os carboidratos são particularmente engordantes – foram todas negligenciadas no ranking do U.S. News. Na verdade, a dieta cetogênica, que restringe acentuadamente carboidratos em favor de gordura, apareceu em último lugar.
Isso é muito ruim: resultados preliminares de um ensaio clínico randomizado recente indicaram que sintomas de diabetes tipo 2 podem ser revertidos em apenas 10 semanas nesse tipo de dieta.Indivíduos que sofriam de diabetes eram ensinados sobre carboidratos e acompanhados durante o período do estudo. Eles efetivamente curaram a si mesmos de sua doença, algo que a medicina convencional nem mesmo acredita ser possível.
Estes são resultados preliminares, mas muitos outros estudos sobre dietas low carb apresentam resultados positivos que são igualmente encorajadores para pessoas com doenças relacionadas à nutrição. Dietas low carb têm sido testadas em pelo menos 78 ensaios clínico randomizados em cerca de 7.000 pessoas, incluindo uma ampla variedade de populações doentes e saudáveis, principalmente nos Estados Unidos. Trinta e dois desses estudos duraram pelo menos seis meses, e seis ensaios tiveram duração de dois anos, tempo suficiente para demonstrar que não há qualquer efeito colateral negativo. Em praticamente todos os casos, as dietas de menor carboidrato e maior teor de gordura tiveram resultados iguais ou melhores do que as dietas concorrentes. As evidências cumulativas mostram que as dietas low carb são seguras e eficazes para combater obesidade, são altamentepromissoras para o tratamento de Diabetes Tipo 2 e melhoram mais os fatores de risco cardiovascular.
No meio de uma crise mundial de obesidade e diabetes, nós não precisamos de mais contribuições de especialistas que não prestam atenção na ciência mais recente ou que não conseguem se libertar de 50 anos de pensamento convencional sobre o que é comer saudável. Promover a mesma recomendação dietética de novo e de novo, enquanto se espera resultados diferentes é realmente um tipo de insanidade, e pior, não está fazendo nada para combater o aumento de doenças e das taxas de mortalidade. Consumidores necessitam informações sólidas sobre como comer para uma boa saúde. A publicação “melhores dietas” do U.S. News não chega nem perto disso.
Gary Taubes é co-fundador da Nutrition Science Initiative e a autor de “The Case Against Sugar”. Nina Teicholz é a fundador da Nutrition Coalition, uma jornalista investigativa e autora do best-seller “The Big Fat Surprise”.
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