Mortalidade de quem come carne branca é menor do que a de quem come carne vermelha
Dados de um levantamento de 2010 nas capitais do País também confirmam distância entre vegetarianos e consumidores de carne
Recorte inédito de dados de mortalidade do Ministério da Saúde de 2010
nas capitais do País, além de confirmar a distância entre a saúde dos
vegetarianos em relação aos onívoros, revela o abismo que separa os consumidores de carne branca e os de carne vermelha.
Os números mostram que a mortalidade das pessoas que consumiam apenas
carne vermelha é, em média, 21% superior à dos que consomem apenas carne
branca– acima da diferença de 17% de mortalidade, independentemente do
tipo de carne, entre vegetarianos e pessoas de dieta onívora.
E
então, a carne vermelha AUMENTA a mortalidade? Reduzir o consumo de
carne vermelha salvará vidas (humanas)? Se você disser que sim, você é
um racista da pior espécie. Percebe?? É a mesma coisa! Não há como estabelecer causa e efeito em um estudo observacional. É um erro. Se você afirmar, com base neste texto de ficção, que carne vermelha aumenta a mortalidade, por uma questão de coerência você se verá obrigado a afirmar que o fato de uma criança ter nascido negra, a sua "raça", a predestina e condena a ter mau desempenho no ENEM.
Ok, você poderia dizer, no caso do ENEM é óbvio que as causas são outras, mas no caso da carne, qual a explicação? Não é óbvio que, nesse caso, a carne é que faz mal mesmo?
Não.
Deixe eu ajudar. Quando estudos epidemiológicos/observacionais implicam carne vermelha na gênese de doenças, normalmente eles comparam, dentro de um universo de milhares de pessoas que respondem a questionários, os 20% que comem menos carne vermelha versus os 20% que comem mais. Chama-se isso de "quintil", ou seja, o "um quinto" do grupo que come mais disso, ou menos daquilo. Será que esses grupos ("quintis") são diferentes em OUTRAS COISAS, além do tipo de carne que comem? Será que, no ENEM, a cor da pele se acompanha de OUTRAS diferenças sociais (renda, oportunidade...)? Abaixo, duas fotos, representativas do quintil que come MAIS carne vermelha, e do que come MENOS:
Ok, você poderia dizer, no caso do ENEM é óbvio que as causas são outras, mas no caso da carne, qual a explicação? Não é óbvio que, nesse caso, a carne é que faz mal mesmo?
Não.
Deixe eu ajudar. Quando estudos epidemiológicos/observacionais implicam carne vermelha na gênese de doenças, normalmente eles comparam, dentro de um universo de milhares de pessoas que respondem a questionários, os 20% que comem menos carne vermelha versus os 20% que comem mais. Chama-se isso de "quintil", ou seja, o "um quinto" do grupo que come mais disso, ou menos daquilo. Será que esses grupos ("quintis") são diferentes em OUTRAS COISAS, além do tipo de carne que comem? Será que, no ENEM, a cor da pele se acompanha de OUTRAS diferenças sociais (renda, oportunidade...)? Abaixo, duas fotos, representativas do quintil que come MAIS carne vermelha, e do que come MENOS:
Ele come muita carne vermelha dentro de seus hamburgers, junto com coca e batatinha - este é um representante TÍPICO do quintil que come mais carne vermelha nos estudos. |
Representante típica do quintil que come menos carne vermelha: elas têm maior nível educacional, maior renda, fumam menos, se exercitam, fazem Yôga e meditação, e queimam incenso. |
Então,
se eu comparar o quintil de pessoas que mais comem carne vermelha,
representado pela foto mais de cima, com o quintil que menos come carne
vermelha, representado pela foto de baixo, qual dos quintis você imagina
que terá melhores desfechos de saúde? Qual você imagina que terá menor
mortalidade por todas as causas? Olhando essas fotos, alguém consegue
imaginar outros fatores, outras variáveis ocultas, que
possam explicar esses desfechos?? E se a carne vermelha for como o
sorvete no exemplo do tubarão, apenas um MARCADOR que identifica um
PERFIL de comportamento de risco?
Também já escrevi sobre isso, e reproduzo abaixo:
Conhecido como European Prospective Investigation in Cancer and Nutrition (EPIC) (Estudo Europeu Prospectivo sobre Câncer e Nutrição), ele incluiu mais 500.000 pessoas de 10 países diferentes que foram questionados sobre um conjunto de diferentes fatores dietéticos, desde o que e o quanto comiam até seu nível de escolaridade, idade, peso, altura, e tabagismo. O estudo indicou que pessoas que comiam muita carne processada também tinham uma chance muito maior de fumar, comer menos frutas e saladas, e ter níveis mais baixos de educação. Eram muito mais gordos e se exercitavam muito menos do que o restante da amostra. E os homens que comiam mais carne processada bebiam muito. Ah, e os maiores comedores de carne eram também mais velhos - muitos já haviam passado dos 70 anos quando sofreram as consequências das salsichas.
E as pessoas que comiam a maior quantidade de carne processada - que o estudo qualificou como mais de 160g por dia (equivalente a cerca de 6 salsichas) - não morreram apenas de de doenças cardiovasculares ou câncer, as coisas que costumamos associar à uma dieta ruim; eles também morreram mais de "outras causas", uma categoria que inclui acidentes de carro, ferimentos acidentais e outras causas não relacionadas à comida. Os maiores consumidores de carne branca, por outro lado, eram os "escoteiros" do grupo: não fumavam muito, comiam bastante salada, faziam exercício, iam à faculdade, e com certeza escovavam os dentes, usavam cinto de segurança e faziam seus check-ups regularmente.
Posso repetir meu trecho favorito? "As pessoas que comiam a maior quantidade de carne processada (...) não morreram apenas de doenças cardiovasculares ou câncer, (...) eles também morreram mais de "outras causas", uma categoria que inclui acidentes de carro, ferimentos acidentais e outras causas não relacionadas à comida. "
Em um mundo onde 100% das pessoas consideram carne vermelha algo letal, quem ousa comer muita carne vermelha? Gente tão desleixada com sua saúde, que não usa cinto de segurança e deixa armas carregadas ao alcance das crianças - é isso que está implícito no texto.
Também já escrevi sobre isso, e reproduzo abaixo:
Conhecido como European Prospective Investigation in Cancer and Nutrition (EPIC) (Estudo Europeu Prospectivo sobre Câncer e Nutrição), ele incluiu mais 500.000 pessoas de 10 países diferentes que foram questionados sobre um conjunto de diferentes fatores dietéticos, desde o que e o quanto comiam até seu nível de escolaridade, idade, peso, altura, e tabagismo. O estudo indicou que pessoas que comiam muita carne processada também tinham uma chance muito maior de fumar, comer menos frutas e saladas, e ter níveis mais baixos de educação. Eram muito mais gordos e se exercitavam muito menos do que o restante da amostra. E os homens que comiam mais carne processada bebiam muito. Ah, e os maiores comedores de carne eram também mais velhos - muitos já haviam passado dos 70 anos quando sofreram as consequências das salsichas.
E as pessoas que comiam a maior quantidade de carne processada - que o estudo qualificou como mais de 160g por dia (equivalente a cerca de 6 salsichas) - não morreram apenas de de doenças cardiovasculares ou câncer, as coisas que costumamos associar à uma dieta ruim; eles também morreram mais de "outras causas", uma categoria que inclui acidentes de carro, ferimentos acidentais e outras causas não relacionadas à comida. Os maiores consumidores de carne branca, por outro lado, eram os "escoteiros" do grupo: não fumavam muito, comiam bastante salada, faziam exercício, iam à faculdade, e com certeza escovavam os dentes, usavam cinto de segurança e faziam seus check-ups regularmente.
Posso repetir meu trecho favorito? "As pessoas que comiam a maior quantidade de carne processada (...) não morreram apenas de doenças cardiovasculares ou câncer, (...) eles também morreram mais de "outras causas", uma categoria que inclui acidentes de carro, ferimentos acidentais e outras causas não relacionadas à comida. "
Em um mundo onde 100% das pessoas consideram carne vermelha algo letal, quem ousa comer muita carne vermelha? Gente tão desleixada com sua saúde, que não usa cinto de segurança e deixa armas carregadas ao alcance das crianças - é isso que está implícito no texto.
IMPORTANTE: isso irá se refletir no estudo epidemiológico, independentemente de a carne ser boa ou má para a saúde!! O que importa, neste caso, é a CRENÇA de que faz mal. Se todo mundo achar que faz mal, só os irresponsáveis comerão em maior quantidade. E como os irresponsáveis são irresponsáveis em outras áreas da vida, eles inevitavelmente morrerão e adoecerão mais. É a profecia autorealizada: basta uma crença ou preconceito existir, para ser detectada nesse tipo de estudo. E, em uma lógica circular, se todo mundo acredita em algo, o estudo mostrando a associação apenas reforçará a CRENÇA em uma relação CAUSAL.
Mas, de que forma comer salsichas poderia CAUSAR acidentes de automóvel?
Então, ficou claro? Bem claro? Dá para entender, bem entendido, que as reais CAUSAS por detrás das associações podem ser outras coisas?
Por favor, repita novamente: "ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS NÃO PODEM ESTABELECER CAUSA E EFEITO"
***XXXX***
Façamos agora um experimento mental. Vamos imaginar que vivemos na África do Sul durante o regime do Apartheid. Neste regime de opressão racial, a wikipedia nos diz que "o
apartheid tem, como centro de suas crenças, que: (I) outras raças
diferentes da branca são inferiores; (II) que um tratamento inferior a
raças "inferiores" é apropriado; (III) e que tal tratamento deveria ser
reforçado pela lei."
Ok? Vamos em frente.
Digamos que, neste contexto, surgisse a notícia do portal IG, aquela que mostrava que os negros têm um desempenho pior no ENEM. Qual você acha que seria a interpretação dada ao estudo? Obviamente seria considerado como um resultado natural e esperado, causado pela reconhecida inferioridade racial e biológica dessa parcela da população.
Mas, alguns poucos excêntricos diriam, é um estudo observacional, não pode estabelecer causa e efeito! Mas, responderiam todos, todo mundo, no fundo, SABE que a CAUSA é a inferioridade. Isso de "causa e efeito versus associação" é só um jogo de palavras, e todos os estudos observacionais mostram a mesma inferioridade.
Ok? Vamos em frente.
Digamos que, neste contexto, surgisse a notícia do portal IG, aquela que mostrava que os negros têm um desempenho pior no ENEM. Qual você acha que seria a interpretação dada ao estudo? Obviamente seria considerado como um resultado natural e esperado, causado pela reconhecida inferioridade racial e biológica dessa parcela da população.
Mas, alguns poucos excêntricos diriam, é um estudo observacional, não pode estabelecer causa e efeito! Mas, responderiam todos, todo mundo, no fundo, SABE que a CAUSA é a inferioridade. Isso de "causa e efeito versus associação" é só um jogo de palavras, e todos os estudos observacionais mostram a mesma inferioridade.
***XXXX***
Já deve estar evidente, para quem leu até aqui, a conclusão desse argumento. Mas o óbvio deve ser dito:
Estudos observacionais e epidemiológicos capturam os vieses, o zeitgeist, os preconceitos de uma época, e o reproduzem. Mais do que isso, embora não possam estabelecer causa e efeito, acabam sendo interpretados de forma a reforçar a causa presumida daquilo que estudam, sob a ótica dos preconceitos e diretrizes vigentes.
***XXXX***
Todos os dias eu recebo emails com notícias sobre estudos observacionais mostrando associaçõesentre
os suspeitos usuais (carne vermelha, gordura saturada, proteína animal,
sal) e todo o tipo de desfecho ruim, exatamente como se esperaria sob a
ótica dos preconceitos e diretrizes vigentes. Muitas dessas associações
já foram refutadas completamente por
ensaios clínicos randomizados - o tipo de estudo que pode efetivamente
estabelecer relações de causa e efeito. Então, de agora em diante,
quando eu responder "mas isso é um estudo EPIDEMIOLÓGICO!", fica desde já claro a importância que se lhes atribuo: servem apenas para levantar hipóteses - e deixam de ser úteis depois que um ensaio clínico já examinou o mesmo assunto, com resultados diferentes.
Longe de mim sugerir que estudos
epidemiológicos são inúteis. Há situações em que um experimento, um
ensaio clínico randomizado, não é viável do ponto de vista ético.
Exemplo clássico é a relação entre cigarro e câncer de pulmão. Não há
como randomizar pessoas para grupo de fumo compulsório versus um grupo
controle, para depois de alguns anos avaliar quantos morrerão em cada
grupo. No caso do câncer de pulmão, o que permitiu a descoberta da
associação foram estudos epidemiológicos - o experimento jamais será
feito. Bem verdade que a magnitude da associação, juntamente com os
demais critérios de Bradford Hill (veja aqui), permitem, nesse caso, uma ilação causal: os fumantes têm CEM vezes mais chance de desenvolver câncer de pulmão.
***XXXX***
A esmagadora maioria das manchetes da
imprensa sobre saúde são baseadas em estudos epidemiológicos, e são
escritas por jornalistas que não sabem o que você acabou de ler aqui. Em
virtude disso, estão cheias de sugestões de causalidade onde deveria
haver apenas afirmações claras de que trata-se apenas de associações.
E, eu não sei se já disse isso... mas ASSOCIAÇÃO NÃO IMPLICA NECESSARIAMENTE CAUSA E EFEITO!
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